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Do Homo Faber ao Animal Laborans

Transcendental mente Estivei Par*

Uma 1 marten temente Instável

2.4. Do Homo Faber ao Animal Laborans

Na classificação proposta por Karl Jaspers, " o homem foi definido como ser vivo dotado de palavra e pensamento (zoon logon echon)r como ser vivo que, agindo, dá

& sociedade a forma de cidade regida por leis (zoon politikon)f como ser que produz utensilios (homo faberif que trabalha com esses utensilios (homo laborons>$ que assegura sua subsistência por meio de plantficaç&o comunitáriaíhomo oeconomicus) " (JASPERS, 1965, p. 47).

Se se aceitar a dassificaç&o de Jaspers, tem-se que diferentes " tipos " de homens tomam parte de diferentes formas de organização social, nos distintos estágios da cvoluç&o da humanidade.

Em oportunidade anterior, fez-se referência tanto ao homem " dotado de palavra e pensamento " quanto ao homem integrante da " cidade regida por leis " . Com as mudanças ocorridas na Idade Média, emerge um "novo" homem: o homo faber, e com a consolidação da modernidade, sucede-o o animal laborans.

O que distingue o homo faber do animal 1 aborans ?

•f» poucas palavras, Hannah fírendt responde dizendo que " o homo faber (...) QfazO e literalmente ôtrabalha sobreu os materiais, em oposição ao animal 1aborans que labora e Õse mistura comQ eles " (fíRENDT, 1983, p. 149).

2.4.1. O HOMO FfíBER

Próprio do homo faber**** ê a fabricação, é o trabalho com material, que n&o é dado e disponível mas jA é produto de mãos humanas, que o retiraram de sua localização original, "...seja matando um processo vital, como no caso da Arvore que tem que ser destruída para que se obtenha a madeira, seja interrompendo algum dos processos mais lentos da natureza, como no caso do ferro, da pedra ou do mármore, arrancados do ventre da terra. Este elemento de viol ação e de violência está presente em todo processo de fabricação, e o homo faber, criador do artificio humano, sempre foi um destruidor da natureza <...). Só o homo faber se porta como amo e senhor de toda a terra " (fíRENDT, 1983, p. 152).

O fato de ser "criador", de por meio de mãos humanas produzir utensílios, também torna o homo faber apto a destruir o trabalho de suas mãos. Por ser dono absoluto, de seus atos, o homo faber pode livremente fabricar os objetos de seu uso e também destruí-lo livremente. Tudo "

o que é produzido por mãos humanas pode ser destruído por elas, e nenhum objeto de uso é tão urgentemente necessário ao processo,vital que o seu fabricante não lhe possa sobreviver e permitir destruí-lo " (fíREHDT, 1983, p. 157).

Fundamental, contudo, é reter que " o homo faber (...) inventou os utensílios e ferramentas para construir um mundo, e não (...) para servir ao processo vital humano "

(fíRENDT, 1983, p. 164).

Portanto, se o que o homo faber busca é não solucionar o problema de sua sobrevivência mas erigir um mundo a partir do trabalho de suas mãos, ele não apenas destrui um mundo que lhe foi dado mas torna o próprio mundo construído vulnerável à sua violência. Vale dizert o mundo que constrói é, a»*es de tudo, extremamente provisório em face da utilidade que dele o homo faber procura extrair*

"...num mundo estritamente utilitário, todos os fins tendem ê ser de curta duração e a transformar-se em meios para

outros fins " (fíRENDT, 1983, p. Í67>. £ no mundo do homo fitber tudo deve, com efeito, " ter seu uso, isto é, servir como instrumento para a obtenção de outra coisa " (fíRENDT, 1983, p. 166>.

O emprego de todas as coisas como instrumentos implica rebaixA-las à condição de meios, inclusive os objetos que não são resultado do trabalho do homo faber. como a terra, e as forças da natureza.

ft crescente "instrumentalização" de tudo, o processo de crescente ausência de significado em que todo o fim se transforma num meio, uma desvalorização do mundo que só finda quando o homem se torna amo e senhor de todas as coisas ê que estabelecem a serventia e a utilidade do que é produzido $ e, assim, também, estabelecem que acima do que o homo faber fabrica está apenas ele, o próprio homem»

Hannah fírendt verifica que "... os gregos temiam esta desvalorização do mundo e seu inseparável antropocentrismo - a opinião "absurda" de que o homem é o mais alto de todos os seres vivos e de que tudo o mais estA sujeito as exigências da vida humana (Aristóteles) - da mesma forma como viam com desprezo a pura vulgaridade de todo o utilitarismo sistemático " (fíRENDT, 19$3, p. 171). "

Platão - diz Hannah fírendt - percebeu desde logo que quando se faz do homem a medida de todas as coisas de uso, está"se correlacionando o mundo com o homem usuário e fazedor de instrumentos, e não com o hoaem orador, pensador ou o homem de ação " (fíRENDT, 1983, p. 171). Em face de tal percepção, Platão estava convencido de que não o homem " nas o deus é a medida (...) dos simples objetos de uso " (fíRENDT, 1903, p.

fí despeito, portanto, do temor dos gregos pela desvalorização do mundo<aa>, o homo faber, ao empenhar-se na "construção" do mundo e na "fabricação" das coisas, acaba por "instrumentalizar" tudo. E como é no isolamento que ele "constrói o mundo" e "fabrica coisas", o homo faber só consegue se relacionar adequadamente com as pessoas trocando o fruto de seu trabalho com elas no mercado, local no qual ele efetivamente " pode exibir os produtos de sua mão e receber a estima que merece " (fíRENDT, 1933, p. 174)<*+> .

2.4.2. O ANIMAL LfíSORfíNS

Como já foi referido, o animal lahorans, ao contrário do homo faber que "trabalha" sobre os materiais,

"labora" e se mistura com eles. Em outros termos, os processos de trabalho executados k maneira do labor são presididos, antes que pelo esforço intencional do homem ou pelo produto por ele desejado, pelo próprio movimento do

processo e pelo ritmo que tal processo impõe aos seus executantes. Os instrumentos do labor adequam-se ã este ritmo "...até que o corpo e o instrumento passam a agitar-se no mesmo movimento repetitivo, isto é, até que, no uso das máquinas - que, entre todos os utensilios, melhor se adaptam h ''per for mace" do animal labor an s - já não é o movimento do corpo que determina o movimento do utensílio, mas sim o movimento da máquina que impõe os movimentos ao corpo * (ARENDT, 1963, p . 159).

Portanto, o labor exige uma execuç&o MritmicamenteM ordenada, tal qual o próprio processo vital - igualmente automático - e o metabolismo da vida com a natureza - igualmente repetitivo. Em face do ritmo exigido pelos seus utensilios, as máquinas, pela necessidade de ajustar seu corpo ao movimento mecânico que lhes ê próprio, " o animal laborans tem vivido 1iteralmente num mundo de máquinas desde que a revolução industrial e a emancipação do trabalho substituíram quase todas as ferramentas manuais por máquinas " (fíRENDT, 1993, p. 160>.

2.4.3. DO HOMO FfíBER flO ONIftfíL LfíBORfíNS

Importa assinalar, em face da preocupação em perceber os movimentos de afirmação do período moderno, que ambos - o homo faber e o animal 1 aborans - são apoliticos e tenderão a denunciar a ação e o discurso como ociosidade. "De modo geral, julgarão as atividades públicas pelo critério da útil idade para fins supostamente mais nobres* no caso do homo faber, tornar o mundo mais útil e belof no caso do animal 1aborans, tornar a vida mais fácil e longa " (fíRENDT, 1983, p. 220).

De fato, desde cedo a idade moderna se preocupou com "produtos tangíveis" e "lucros demonstrateds", denunciando a inútil idade e a ociosidade da ação e do discurso. Em outros termos, a fim de que escapasse de sua situação como prisioneiro do ciclo do processo vital e mobilizasse sua capacidade de fazer e produzir, o homem' precisou abdicar de sua vocação de "zoon logon echon" e

"zoon politikon". ft completa perda de tal vocação dar-se-ia com a derrota do homo faber e a vitória do animal lahqrans.

explicáveis pelo fato de que, com o enaltecimento da vita activa. o labor veio a ser aquela atividade a ser promovida m mais alta posição entre as capacidades do homem (fíRENDT, 1983, pp. 326-27>.

Não obstante, a anteriormente mencionada inversão da ordem hierárquica que estabeleceu a precedência da vita actiya. obriga a refletir com cuidado se "labor" já não é "...uma palavra muito elevada, muito ambiciosa para o que estamos fazendo ou pensamos que estamos fazendo no mundo em que passamos a viver. 0 último estágio de uma

sociedade de operários, que ê a sociedade de detentores de empregos, requer de seus membros um funcionamento permanente automático, como se a vida individual realmente houvesse sido afogada no processo vital da espécie, e a única decisão ativa exigida do indivíduo fosse deixar-se levar, por assim dizer, abandonar a sua individual idade, as dores e as penas de viver ainda sentidas individualmente, e aquiescer num tipo funcional de conduta entorpecida e QtranquilizadaQ "

(ARENDT, 1983, p. 335>.

2.5. O Processo de TransicSo Para a Ordem Social