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O mundo das últimas duas décadas apresentou uma diferença abismal face aos aspectos que o caracterizaram nos períodos que se seguiram ao final da II Grande Guerra.

Mais recentemente verificaram-se grandes mudanças ao nível social, económico e tecnológico. A acrescentar ao rol de transformações verificadas, há a assinalar uma nova readequação dos espaços económicos nacionais e transnacionais em que a reunificação alemã, a desagregação do bloco ideológico-político-económico-militar da Europa de Leste, os conflitos étnicos nos Balcãs e a formação do espaço político-económico da União Europeia, se apresentam como paradigmáticos quer para a compreensão das dinâmicas da globalização, quer para repensar o contexto de políticas económicas e o lançamento de um novo olhar sobre os papéis que os espaços locais podem vir a desempenhar neste novo contexto.

Durante décadas, a Sociologia e a Economia desenvolveram teorias em torno da questão do desenvolvimento económico, colocando em dicotomia os países ricos industrializados e desenvolvidos e os países do terceiro mundo, pobres, subdesenvolvidos e altamente dependentes das lógicas dominantes dos primeiros.

Face a uma conjuntura económica de profundas transformações, onde os sintomas de crise não são alheios, há que reequacionar toda esta questão, ou seja, há que considerar a problemática do desenvolvimento em primeira prioridade, e abandonar a ideia, por ora já cristalizada, que essa questão é exclusiva do terceiro mundo. A reflexão leva José Arocena1 a afirmar que mesmo as velhas nações industrializadas devem, elas também, ser vistas como estando em vias de desenvolvimento.

Hoje, as questões sobre o desenvolvimento ganham maior pertinência se considerarmos as fórmulas já ensaiadas ou postas em prática: as políticas anti-inflacionárias e monetárias, que se traduziram em pequenos êxitos ou em grandes

1 - Cf. AROCENA, José (1986) - Le Développement par l’Initiative Locale, Paris, L’Harmattan, p. 11

endividamentos por parte dos vários países que constituem o sistema mundial.

Estamos então perante a necessidade de procurar novas formas de mobilização do potencial humano, necessariamente diferentes dos modos anteriores de pensar o desenvolvimento, e que podem ser corporizadas a partir de iniciativas locais.

Ao debate sobre as questões do desenvolvimento económico interessa, simultaneamente, o problema da criação de riqueza e o problema do emprego. Estas duas questões parecem estar intimamente relacionadas com a forma de planear e gerir um território. Daí que quando se fala no actor principal, sempre envolvido nestas questões, a referência é feita ao governo local. Todavia, o governo local não pode trabalhar independentemente, quer dos outros níveis de governo – regionais ou nacional – quer de outros actores não governamentais.

Se aceitarmos o princípio de que “a mudança estrutural é o maior estímulo à acção”,1 então os Governos, os agentes económicos e as pessoas não poderão ficar impassíveis, nem deixar que as várias formas da economia sejam alteradas sem a sua participação.

Esta capacidade de iniciativa tem a sua emergência a partir dum contexto de crise, ao mesmo tempo que apela a uma grande mobilização dos actores locais face a um conjunto de questões que podem funcionar como “agentes estimuladores para a acção” 2 e que se passam a descrever:

a) A internacionalização dos mercados

b) O impacto da mudança das condições dos mercados na estrutura industrial c) A reestruturação económica e o desenvolvimento

d) A pressão fiscal e) A actividade local

f) O aumento da sensibilidade às questões ambientais g) A reestruturação do welfare

h) A pressão demográfica

1 - BENNET, Robert J.; KREBS, Gunter (1991) - Local Economic Development, Londres e Nova York, Belhaven Press, p. 8

2 - Foram adoptados os “estimuladores para a acção” propostos por BENNET, Robert J.; KREBS, Gunter (1991) - idem, pp. 8-11

Perante este conjunto de questões, pareceu importante proceder à construção de um objecto teórico que incida sobre a análise dos actores e suas estratégias face ao desenvolvimento local. O objecto empírico é o município de Palmela, um dos nove municípios que constituem a denominada Península de Setúbal.

Palmela é um município que já não é rural, mas que ainda não é urbano, possuindo uma área de 461.82 Km2, que faz dele o maior município, em superfície, da Península de Setúbal. A sua posição, no ponto de vista geográfico, é a de charneira ente o Alentejo e a Península de Setúbal, fazendo confluência com sete dos nove municípios que a constituem.1

Esta característica geográfica contribuiu para que se verifiquem nos tempos mais recentes duas realidades perfeitamente distintas. A zona oriental, marcadamente rural e com um tipo de habitat semelhante ao do Alentejo e a zona ocidental, mais industrializada e mais urbanizada.

Durante mais de um século, este município assentou num modelo de desenvolvimento baseado no autocentramento agrícola, verificando-se, ainda hoje, um peso bastante significativo por parte do sector agrícola na sua economia.

Todavia, os incentivos que a agricultura tem vindo a receber, bem como a sua inserção no espaço metropolitano de Lisboa, tem vindo a contribuir para que se tivessem processado alterações significativas neste sector.

Palmela foi mantendo, até há poucos anos, uma incipiente industrialização, pelo que durante a crise verificada em toda a Península de Setúbal, esta se manteria imune.

Tal situação deve-se essencialmente ao facto das suas unidades produtivas não se inscreverem nos sectores mais atingidos, como sejam a indústria naval, a montagem de automóveis, a siderurgia.

Os anos oitenta viriam, contudo, a contribuir para que o município se abrisse à procura de novos espaços, por parte de empresas que, atraídas pelos incentivos da Operação Integrada de Desenvolvimento da Península de Setúbal, (OID/PS) rumavam à Península, e em particular ao município de Palmela, que lhes oferecia óptimas condições urbanísticas, mercê da construção de infra-estruturas de circulação que entretanto foram

1 - Exceptuam-se os municípios de Almada e Seixal.

sendo realizadas.

Já os anos noventa se mostraram cruciais não só para o município de Palmela, como para os restantes municípios que integram a Península de Setúbal. Em 1995, com o início da produção na fábrica Autoeuropa localizada no município de Palmela, novo fôlego foi sentido, sobretudo em matéria de investimentos e de criação de empregos.

Na primeira década do novo milénio e perante uma estrutura produtiva dependente estruturalmente do exterior, num país que teima em não definir estratégias e objectivos específicos de desenvolvimento torna-se cada vez mais pertinente a análise das estratégias de actores face ao futuro do território em que interagem.

Esta pertinência já começou a ganhar importância ao nível da análise sociológica sobre o desenvolvimento local, assistindo-se ao apelo à territorialização das relações sociais e ao entrosamento destas com a internacionalização das economias, e na polarização das decisões em regiões ou cidades globais.

O Espaço tem uma definição histórica, tem uma definição económica, tem uma definição social

António Simões Lopes, Desenvolvimento Regional, p. 23

2 - AS ABORDAGENS SOCIOLÓGICAS E ECONÓMICAS