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Necessidades de rega das culturas

3. Impacte das alterações climáticas nas necessidades de rega das

3.4. Resultados e Discussão

3.4.1. Necessidades de rega das culturas

As necessidades de rega anuais (NR) de cada cultura foram calculadas com o programa IrrigRotation.

Os resultados obtidos para os cenários de alteração climática para a medida de adaptação novas variedades culturais (NVC) apontam para um aumento dos valores das NR para todas as simulações (Quadro 3.3). No entanto, não se observa um aumento da variabilidade das NR uma vez que os valores do coeficiente de variação (CV) se mantêm praticamente inalterados.

A beterraba sacarina (cultura de Outono/Inverno) apresentou os maiores aumentos das NR variando a percentagem de aumento entre 48 e 66% para o CE Beja e entre 43 e 62% (Fig. 3.2a) para o CE Évora (Fig. 3.3a).O aumento, em percentagem, dos valores das NR para as culturas de Primavera/Verão (milho, tomate, girassol, melão e arroz) oscilou entre 10 a 36% para o CE Beja (Fig. 3.2a) e entre 13 a 30% para o CE Évora (Fig. 3.3a) sendo estes aumentos muito menores do que os obtidos para a beterraba sacarina.

O aumento nas NR das culturas de Primavera-Verão é explicado principalmente pelo aumento das necessidades hídricas das culturas, uma vez que a região do Alentejo tem um clima mediterrânico, com pouca precipitação durante o verão. Os maiores aumentos das NR para a cultura da beterraba sacarina são consequência dos efeitos cumulativos das maiores necessidades hídricas das culturas e dos valores mais baixos de precipitação durante o período de desenvolvimento das culturas, uma vez que a precipitação tem um papel importante nas culturas de Outono-Inverno.

As culturas permanentes, vinha e olival, obtiveram valores intermédios de aumentos das NR que se situam entre 37 e 57% para CE Beja (Fig. 3.2a) e entre 27 e 43 % para o CE Évora (Fig. 3.3a).

A medida de adaptação variedades culturais atuais (VCA) apresentou uma manutenção ou uma ligeira redução das necessidades de rega para todas as culturas anuais (Fig. 3.2b, 3.3b). No caso das culturas permanentes (vinha e olival), observou-se um aumento considerável das NR especialmente para o CE Beja onde os aumentos para estas duas culturas variaram entre 4 e 20%. Em relação à variabilidade das NR, os valores do coeficiente de variação (CV) permaneceram

praticamente constantes para a maioria das culturas (exceto para a beterraba sacarina, que apresentou um ligeiro aumento).

a)

c) Figura 3.2 – Aumento médio das necessidades de rega para os cenários de alteração climática (2071-2100), relativamente ao período de referência, para CE Beja para a medida a) novas variedades culturais (NVC) e para b) as variedades culturais atuais (VCA).

0%

SB-M-T-W Wheat S-W-B Wheat S-W-B Barley

Increase in water deficit (%)

Crops

Beja

HadRM3P A2 HadRM3P B2 HIRHAMh A2 HIRHAMhh A2

a)

b)

Figura 3.3 – Aumento médio das necessidades de rega para os cenários de alteração climática (2071-2100), relativamente ao período de referência, para CE Évora para a medida a) novas variedades culturais (NVC) e para b) as variedades culturais atuais (VCA).

0%

SB-M-T-W Wheat S-W-B Wheat S-W-B Barley

Increase in water deficit (%)

Crops

Beja

HadRM3P A2 HadRM3P B2 HIRHAMh A2 HIRHAMhh A2

Quadro3.3 – Necessidades de rega anuais (NR) para o período de controlo (1961-1990) e para os diferentes cenários de alteração climática (2071-2100) considerando as medidas de adaptação novas variedades culturais (NVC) e variedades culturais atuais (VCA)

Controlo HADRM3P HADRMP HIRAMh HIRAMhh

A2 B2 A2 A2

NR (mm) NR (mm) NR (mm) NR (mm) NR(mm) Caso de Estudo Beja NVC VCA NVC VCA NVC VCA NVC VCA B-M-T-T Beteraba Méd 461 765 418 684 450 763 425 767 428 sacarina CV 0.23 0.16 0.27 0.19 0.24 0.20 0.27 0.20 0.30 B-M-T-T Milho Méd 736 975 706 885 706 958 709 956 703.5

CV 0.10 0.13 0.15 0.15 0.17 0.11 0.15 0.11 0.15 B-M-T-T Tomate Méd 778 933 772 882 765 928 773 920 771 CV 0.08 0.06 0.08 0.07 0.09 0.08 0.11 0.08 0.1 G-T-C Girassol Méd 741 1013 795 909 754 1007 771 1005 787 CV 0.12 0.10 0.13 0.13 0.16 0.13 0.17 0.14 0.17 Monocult Melão Méd 611 721 552 671 580 726 559 715 559 CV 0,08 0,08 0,1 0,09 0,12 0,08 0,13 0,08 0,13 Monocult Arroz Méd 1054 1306 1027 1224 1038 1314 1054 1303 1041 CV 0,08 0,06 0,08 0,08 0,1 0,09 0,11 0,09 0,11 Monocult Vinha Méd 122 191 139 167 131 182 132 175 127 CV 0,35 0,27 0,33 0,28 0,38 0,22 0,35 0,26 0,39 Monocult Olival Méd 222 339 266 306 259 319 257 324 261 CV 0,2 0,14 0,17 0,18 0,21 0,18 0,21 0,19 0,21 Caso de Estudo Évora NVC VCA NVC VCA NVC VCA NVC VCA B-M-T-T Beterraba Méd 400 634 355 572 361 650 351 646 349 sacarina CV 0.16 0.16 0.23 0.24 0.29 0.20 0.26 0.19 0.30 B-M-T-T Milho Méd 685 873 641 817 662 885 665 877 659 CV 0.12 0.09 0.12 0.13 0.16 0.08 0.11 0.08 0.11 B-M-T-T Tomate Méd 699 845 688 795 695 840 700 826 692 CV 0.08 0.07 0.07 0.08 0.1 0.07 0.09 0.07 0.09 G-T-C Girassol Méd 653 825 639 755 625 843 651 825 650 CV 0.11 0.08 0.12 0.13 0.15 0.11 0.15 0.11 0.14 Monocult Melão Méd 554 661 513 627 538 663 525 656 517 CV 0,09 0,08 0,09 0,09 0,11 0,08 0,13 0,07 0,12 Monocult Arroz Méd 938 1209 952 1120 951 1220 980 1199 957 CV 0,1 0,07 0,09 0,09 0,12 0,1 0,12 0,09 0,12 Monocult Vinha Méd 150 209 158 190 156 206 158 203 158 CV 0,15 0,09 0,12 0,1 0,16 0,11 0,14 0,11 0,13 Monocult Olival Méd 266 381 298 346 293 367 296 363 290 CV 0,12 0,09 0,1 0,12 0,13 0,12 0,13 0,12 0,12

[a]Méd. – valores médios das NR; CV – coeficiente de variação dos valores das NR.

A cultura da beterraba sacarina (medida de adaptação VCA) resultou nas maiores reduções nos valores das NR (Fig. 3.2b, 3.3b), em contraste com os resultados que foram obtidos para esta cultura para a medida de adaptação NVC (Fig. 3.2a, 3.3a), com o encurtamento do ciclo da cultura a reduzir a exposição da cultura ao período de maior stress hídrico. Para as culturas de primavera-verão, os valores das NR aumentaram entre -4 e 7% para o CE Beja e entre -6 e 0% para o CE Évora.

Quando se aumenta a permanência da cultura no terreno de forma a permitir manter o nível de intersecção da radiação que se verifica atualmente (medida de adaptação NVC) as NR aumentam substancialmente para os dois casos de estudo e para todos os cenários das alterações climáticas, podendo variar entre 10 e 66%

para CE Beja e entre 13 e 62% para CE Évora.

Para a medida de adaptação intensificação da produção (IP), verifica-se um forte aumento das necessidades de rega. Para o período de controlo as NR do milho variaram entre 697 e 743 mm. Verifica-se que, para o cenário B2 na sequência de culturas trigo-milho (T-M) as NR variam entre 1006 e 1066 e para o cenário A2 entre 1040 e 1111 mm. Relembra-se que no caso da sequência de culturas T-M a cultura do trigo é regada visando o conforto hídrico. Os aumentos médios para esta medida de adaptação variaram entre 43 e 52%, tendo os valores de aumento sendo ligeiramente superiores para o CE Évora (Fig. 3.4).

Figura 3.4 - Aumento médio das necessidades de rega para os cenários de alteração climática (2071-2100), relativamente ao período de referência, para a) CE Beja e b) CE Évora para a medida de adaptação intensificação da produção (IP).

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

CE Beja CE Évora

Variação das necessidades de rega (%)

Culturas

IP - Trigo + Milho

HadRM3P A2 HadRM3P B2 HIRHAMh A2 HIRHAMhh A2

Quando se olha para os resultados tendo em atenção apenas os cenários das alterações climáticas conclui-se que, de um modo geral, todas as simulações com o cenário B2 conduziram a aumentos menores do que as realizadas com os dados do cenário A2, o que era de esperar já que o cenário B2 corresponde a um cenário de desenvolvimento socioeconómico com um menor nível de emissões de CO2. Comparando agora os resultados obtidos para os dois casos de estudo, verifica-se que de um modo geral as estimativas dos aumentos das NR tanto para o CE Beja (Fig. 3.2) como para o CE Évora (Fig. 3.3) foram semelhantes. No entanto, a cultura do girassol apresentou para a medida de adaptação NVC, um valor de aumento das NR maior para o CE Beja (entre 23 e 37%) do que para o CE Évora (16 a 29%). Esta diferença é realçada na medida VCA onde o aumento das NR para o CE Beja (entre 2 e 7%) foi consideravelmente maior do que o aumento das NR para o CE Évora (-4 a 0%). O mesmo se verifica com a vinha e o olival que apresentam valores de aumento das NR consideravelmente maiores para o CE Beja do que para o CE Évora. Esta diferença ocorreu porque a cultura do girassol no CE Beja foi cultivada em barros pretos (Bpc), que apresentam um elevado valor para a reserva utilizável (RU), depois de duas culturas de sequeiro que esgotam a reserva de água no solo até ao nível do coeficiente de emurchecimento. No caso da vinha e do olival como são culturas permanentes que são regadas com défice hídrico o valor da reserva de água no solo também apresentará valores mais baixos do que no caso das outras culturas em que a rega é efetuada visando o conforto hídrico. Para as futuras condições de maior secura, a precipitação não será suficiente para repor a reserva de água no solo nos barros pretos à capacidade de campo. Assim, os valores das NR aumentarão mais para o CE Beja para compensar o maior défice de água no solo.

Em conclusão realçam-se os seguintes aspetos:

a) Os aumentos das NR para a medida de adaptação NVC estão em linha com os resultados alcançados com outros estudos realizados para a bacia do Mediterrâneo por Rodriguez Díaz et al. (2007) e Daccache et al. (2010). Estes estudos seguiram a abordagem em que não se ajusta a fenologia das culturas em função dos graus de crescimento dia (GDD), o que corresponde à utilização de novas variedades com ciclos de crescimento mais longos, a fim de minimizar as perdas de produção devido ao encurtamento do ciclo da cultura.

b) Os resultados das simulações para a medida de adaptação VCA indicam que os valores das NR tendem a manter-se estáveis ou a apresentar uma ligeira redução com o encurtamento do período de crescimento da cultura a compensar a redução da precipitação e o aumento da ETo. Estes resultados estão de acordo com os resultados alcançados por Lovelli et al. (2010) para a Itália, e Todorović et al. (2012) para os países da ex-Jugoslávia. Estes estudos

utilizaram a abordagem dos graus de crescimento dia (GDD) para ajustar o ciclo das culturas tendo obtido como resultados uma ligeira redução ou a manutenção dos valores atuais das NR.

c) A manutenção ou a diminuição dos valores das NR para a medida de adaptação VCA poderá sugerir numa primeira análise que, para os cenários futuros de alteração climática, a procura de água para rega não irá aumentar fortemente. No entanto deve ter-se em atenção que a medida de adaptação VCA poderá levar à intensificação da produção pois o encurtamento do ciclo das culturas poderá permitir a realização de mais do que uma cultura por ano, como no caso da sequência de culturas T-M. Se isso acontecer, o aumento das NR será muito elevado. Assim, no caso da intensificação da produção o aumento da procura de água para rega aumenta de uma forma muito expressiva o que poderá resultar numa elevada pressão sobre os recursos hídricos.

d) Os resultados obtidos para as três medidas de adaptação indicam que os impactes das alterações climáticas nas necessidades de rega são muito dependentes das medidas de adaptação adotadas pelos agricultores. Este resultado confirma as conclusões obtidas por Mo et al. (2013).